A necessidade (e urgência) da arquitetura corporativa

If you want to truly understand something, try to change it.
Kurt Lewin

Empresas têm dificuldades para realizarem suas estratégias. Com frequência, o problema não está nas atividades de planejamento, mas, sim, na execução.

Uma análise superficial pode dar a entender que a causa raiz para as falhas da implementação da estratégia é a falta de engajamento ou comprometimento das pessoas. Entretanto, esse raramente é o caso. A verdade é que a gestão da rotina costuma consumir muito do tempo do time gestor, deixando pouco tempo para as adaptações táticas e operacionais.
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A implementação da estratégia, quando esta é bem formulada, demanda mais do que ações pontuais, mas a implementação de iniciativas estruturantes. Raramente, mudanças com impacto estratégico real são resultantes de ações determinísticas, ou seja, com resultados certos e garantidos. No lugar disso, resultados estratégicos são alcançados com “estímulos” que conduzem a organização para o lugar certo.

Iniciativas estruturantes impactam, invariavelmente, a arquitetura corporativa.

Seja para a evolução ou para a transformação do negócio, ajustes arquiteturais são sempre necessários e estes tem mais chances de sucesso quando conduzidos com metas claras e métodos consolidados. Quando o assunto é execução da estratégia, amadorismo e improviso costumam gerar péssimos resultados.

O que é arquitetura corporativa?

Antes de explicar “arquitetura corporativa” (enterprise architecture) é útil entender, primeiro, o significado dessas duas palavras, “arquitetura” e “corporativa”, isoladamente.

Arquitetura trata dos conceitos ou propriedades fundamentais de um sistema em seu ambiente incorporados em seus elementos, relacionamentos e nos princípios de seu design e evolução.

ISO/IEC/IEEE 42010:2011

De maneira geral, arquitetura sempre trata de “entender o todo a partir das partes”. Ou seja, decompor sistemas em seus elementos, explicitando responsabilidades destes, explicando como eles se relacionam e, finalmente, entendendo como eles devem evoluir ao longo do tempo.

O padrão TOGAF considera “enterprise” qualquer conjunto de organizações que têm objetivos comuns.

Por exemplo, uma “enterprise” pode ser:

  • Uma empresa inteira ou uma divisão de uma empresa;
  • Uma agência governamental ou um único departamento governamental;
  • Uma cadeia de organizações geograficamente distantes ligadas entre si por propriedade comum;
  • Grupos de países ou governos trabalhando juntos para criar produtos ou infraestruturas comuns ou compartilháveis;
  • Parcerias e alianças de empresas trabalhando juntas, como um consórcio ou cadeia de suprimentos;

The TOGAF Standard, Version 9.2

Quando fazemos análises sob a perspectiva “corporativa”, estamos SEMPRE analisando sistemas organizacionais em sentido amplo, holístico, integrando desde a perspectiva estratégica, relacionando tática e operação, geralmente sob quatro ângulos:

  1. negócios, contemplando a estratégia de negócios, métodos de governança, estrutura organizacional e táticas, papéis e responsabilidades, processos-chave e práticas operacionais;
  2. dados, indicando a organização e estruturação, lógica e física, dos recursos para aquisição, tratamento,  manutenção e gestão dos dados chaves da organização, ampliando-os a informações e conhecimento;
  3. aplicações, considerando os diversos artefatos que suportam o negócio, a forma como são desenvolvidos e distribuídos, seus relacionamentos e integrações.
  4. tecnologia, incluindo todo software hardware necessário para que a organização consiga atingir sua intencionalidade (negócios), adequadamente suportada por dados e aplicações. Trata da infraestrutura de TI, mas não está restrita a ela.

A arquitetura corporativa, então, pode ser entendida como todos os elementos de uma organização – incluindo, mas não restrito a, departamentos, processos, papéis, sistemas de software e hardware – os relacionamentos entre estes elementos e, finalmente, a estratégia – padrão coerente para tomada de decisões e princípios de governança – que direcionam a evolução.
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Toda empresa tem uma arquitetura corporativa – ou seja, componentes de negócios, dados, aplicações e infraestrutura. Entretanto, em muitos casos, essa arquitetura foi “emergente”. Ou seja, não foi planejada e simplesmente “aconteceu” ao longo do tempo.
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Arquitetura corporativa como prática

Frente a conclusão de que toda enterprise possui uma arquitetura, é útil, também, entender que há um conjunto de práticas e padrões, papéis e responsabilidades, que podem ajudar em sua definição e evolução.

A arquitetura corporativa (EA) é uma disciplina para liderar de forma proativa e holística as respostas corporativas às forças disruptivas, identificando e analisando a execução da mudança em direção à visão de negócios e aos resultados desejados. A EA agrega valor ao apresentar aos líderes de negócios e de TI recomendações prontas para o ajuste de políticas e projetos para alcançar resultados de negócios direcionados que capitalizem em interrupções de negócios relevantes.

Gartner

As práticas de arquitetura corporativa tiveram sua origem dentro de departamentos de TI. Entretanto, é fundamental deixar claro que, modernamente, elas, por razões óbvias, extrapolam as fronteiras de qualquer departamento da organização.

Sendo bem claro, arquitetura corporativa não é arquitetura de negócios, software, dados,  integração ou infraestrutura.  Entretanto, a prática das arquiteturas de negócios, software, dados, integração e infraestrutura são “orquestradas” pela arquitetura corporativa.

Há, no mercado, métodos e frameworks consagrados, como o TOGAF, que dão referências sólidas sobre o que deve ser feito e como. Entretanto, é essencial que cada organização “tropicalize” essas práticas a  suas realidades.

O papel do arquiteto corporativo

Toda organização tem uma arquitetura. Nem sempre, entretanto, como já dizemos, ela é suportada por boas práticas arquiteturais.

Há quem entenda que as boas práticas arquiteturais devem ser reforçadas e praticadas por todas as lideranças e concordamos com isso. Entretanto, também entendemos que algo que é responsabilidade de todos, acaba recebendo cuidados de ninguém. Assim, é importante a definição de um papel responsável por implementar práticas de arquitetura corporativa do jeito certo.

O arquiteto corporativo, em uma organização, é o responsável por garantir que boas práticas de arquitetura sejam adotadas. Ele os esforços estratégicos, táticos e operacionais, suportando decisões que facilitem a realização da intencionalidade.

Em um mundo onde especialistas sabem cada vez mais sobre cada vez menos, não se pode esperar que uma única pessoa seja capaz de conduzir todas as atividades importantes relacionadas com a arquitetura. Entretanto, parece coerente ter alguém preocupado e responsável por garantir que essas atividades sejam executadas – este é o papel do arquiteto.
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O arquiteto corporativo é, idealmente, um orquestrador. Ele garante que todas as partes interessadas sejam ouvidas e suas ponderações sejam levadas em conta na formulação da arquitetura. Para isso, elabora e mantém artefatos abrangentes que facilitam o engajamento.

O arquiteto corporativo deve, de tempos em tempos, revisar a estrutura de componentes e suas relações de um software para garantir que os objetivos do negócio serão atingidos, as restrições obedecidas e os atributos de qualidade atendidos. Além de tudo isso, o arquiteto deve adotar postura “provocativa” para verificar se a entrega está maximizada frente ao melhor custo.

Há, certamente, muitas organizações que têm sucesso em fazer cumprir seus propósitos sem ninguém ocupando, formalmente, o papel de “arquiteto”. Entretanto, nessas organizações, as atividades são diluídas entre vários outros papéis e, geralmente, acaba ocorrendo acidentalmente. Nesses casos, é comum que executivos tenham cicatrizes relacionadas a decisões arquiteturais semelhantes as que são necessárias para o contexto em que estão trabalhando, diminuindo o risco da ausência do pensamento arquitetural mais especializado. Há ainda, claro, cenários onde pessoas executam o ‘papel de arquiteto’, sem o devido reconhecimento formal.

Arquitetura corporativa é multi-temporal

Há sempre, pelo menos, duas visões a respeito da arquitetura. A primeira, trata da arquitetura como ela está (AS-IS). A segunda, projeta como a arquitetura deverá ser (TO-BE). Seja, para adequar aos novos tempos, seja para compensar dívidas técnicas.
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Quanto mais explícitas forem as condições atuais (AS-IS) e mais explícitas forem as expectativas para o futuro (TO-BE), mais fácil será planejar a evolução arquitetural através de “arquiteturas intermediárias”.

Relação com a lei de Conway

Tratar da arquitetura de um software, dados ou infraestrutura implica, fatalmente, em tratar da estrutura da organização que o utiliza e vice-versa.

Organizações que desenvolvem sistemas tendem a produzir sistemas que são cópia das estruturas de comunicação dessas empresas. 

Melvin Conway

A estrutura dos componentes de um software, por exemplo, impacta na formação dos times que vão desenvolver o software. Não há, por exemplo, chances de implementar arquiteturas baseadas em microsserviços em estruturas organizacionais com times monolíticos. Se o time for indivisível, o software também o será!

A lei de Conway

Se você deseja entender mais sobre a lei de Conway, preparamos um conteúdo com áudio e vídeo que a explica em detalhes.

Acessar episódio

A arquitetura de software, porém, excede a estrutura dos times de desenvolvimento. Na prática, a estrutura de componentes de um software acaba impactando também a própria estrutura corporativa da empresa que adotará o produto tecnológico. Isso leva, por exemplo, a profundas modificações, mesmo em empresas sólidas, quando há migração de um sistema chave ou, ainda, resistência acentuada a mudança e aumento dos custos.

A arquitetura corporativa equilibra e alivia os impactos da lei de Conway, garantindo maior eficiência e eficácia.

Esse é apenas o começo de uma grande e bela jornada

Gostamos muito da ideia de dar passos consistentes na direção certa, o tempo todo. Nesta introdução, tentamos consolidar impressões sobre arquitetura corporativa, suas práticas e as atribuições de um arquiteto. Nos próximos capítulos, vamos apresentar algumas “boas práticas”  que temos vivenciado como arquitetos e consultores.

// TODO

Antes de avançar para o primeiro capítulo, recomendo as seguintes atividades:

  • Reflita sobre as práticas de arquitetura corporativa que você tem presenciado. O que tem funcionado? O que não tem gerado os resultados esperados?
  • Você consegue relacionar, hoje, arquiteturas de negócios, dados, aplicações e infraestruturas em sua organização?
  • Você consegue relacionar os principais objetivos estratégicos de negócio na empresa onde está atuando?

Referências bibliográficas

GARTNER. Gartner Glossary: enterprise architecture (ea). Enterprise Architecture (EA). Disponível em: https://exco.me/3FuFq3w. Acesso em: 24 dez. 2021.

THE OPEN GROUP. The TOGAF® Standard, Version 9.2. Disponível em: https://exco.me/3yTG2ND. Acesso em: 24 dez. 2021.

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Maria de Fátima Fagherazzi Pizzoli
Maria de Fátima Fagherazzi Pizzoli
2 anos atrás

Muito bom! O texto está claro, bem didático.

Wesley
Wesley
2 anos atrás
Feedback no conteúdo deste capítulo A arquitetura corporativa, então, pode ser entendida como todos os elementos de uma organização - incluindo, mas não restrito a,…" Ler mais »

Acredito que seria mais claro destacar que a arquitetura corporativa é a combinação e organização dos elementos citados e seus relacionamentos que permite que a empresa exista e cumpra seus objetivos, tenha ela uma estratégia para isso ou não.
Assim fica mais claro dizer que a arquitetura pode ser emergente, onde a organização dos elementos surgiu sem planejamento para atingir algum dado objetivo na vida da empresa.

AUTOR

Elemar Júnior

Fundador e CEO da EximiaCo, atua como tech trusted advisor ajudando diversas empresas a gerar mais resultados através da tecnologia. 

COAUTOR

Juares Rigotti

Consultor estratégico na EximiaCo, habituado a solucionar problemas complexos – equilibrando pessoas, processos e tecnologia – de maneira simples.

Mentoria em

Arquitetura Corporativa

Como estruturar as práticas de arquitetura corporativa e gerar os artefatos base para acelerar geração de resultados.

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